Eu achei super curiosa e um tanto quanto bizarra a ligação da Wicca com o santo católico. Esse assunto ficou martelando a minha cabeça por dias e dias, até que eu resolvi sentar aqui e escrever um pouco sobre os dois assuntos.
Primeiro falemos de São Cipriano...
Cipriano, pelo que se sabe, nasceu por volta de 250 d.C, e converteu-se ao cristianismo depois de conhecer Justina (que foi canonizada, assim como Cipriano).
Antes de sua conversão, porém, Cipriano estudou ocultismo, dedicando-se a práticas mágicas que, ao que parece, por obra da deturpação inerente à história do paganismo, foram associadas ao demônio.
Muito da obra do referido santo católico foi queimada, dizem, por ele mesmo. O que permaneceu é hoje conhecido como os livros de São Cipriano. Neles estão contidos alguns ensinamentos e algumas bizarrices também. Tive a oportunidade de ler algumas vezes, estudando um pouco a trajetória de Cipriano, arrisco dizer que ali também encontramos deturpações. Teriam sido forjadas pelo próprio Cipriano, após a sua conversão, a fim de atribuir ao demônio a responsabilidade por suas práticas? Talvez. De fato, me parece uma saída bem confortável praticar o que chamamos de baixa magia, colocar a culpa no Diabo e nos colocarmos em posição de vítimas.
As poucas obras de Cipriano que restaram teriam sido alteradas por aqueles que as traduziram? Possível também, vez que na própria bíblia encontramos interpolações. No entanto, um estudo profundo dos originais seria necessário para poder dizer se alterações posteriores foram feitas.
Existe ainda a possibilidade de Cipriano ter realmente estudado práticas deturpadas de ocultismo. Nesse caso, os escritos seriam obra dele mesmo, bem com a cara que se vê hoje.
De qualquer forma, paira em torno desses escritos uma nuvem de mistério, poder oculto e fruto proibido. Tanto que até hoje muita gente acredita dar má sorte possuir esse livro.
Talvez seja esse o motivo de pessoas relacionarem a leitura da obra com a Wicca. A própria Wicca é pouco compreendida e atrai pessoas que buscam poderes mirabolantes, feitiços para amarrar o par, adolescentes rebeldes – muitas vezes sem causa. A maioria desconhece sua origem e seus preceitos. Dentro da própria Wicca poucos aprofundam os estudos, poucos buscam as raízes daquilo que dizem cultuar.
Posso dizer com firmeza o que muitos já disseram: Wicca nada tem a ver com práticas que são associadas ao diabo cristão. Os wiccanos ou wiccanianos não crêem no diabo cristão e, por obviedade, não o invocam em seus sabás.
Pratica Wicca de forma correta aquele que celebra o ciclo vida-morte-renascimento.
Foi bastante difundida por Gardner, Sanders entre outros, e possui elementos de práticas antigas e modernas. Por isso é chamada de neopagã. Talvez resida nos termos “neopagão” e “pré cristão” o cerne de discussões acirradas sobre a origem da Wicca. Porém, são termos que não se confundem.
Neopagão é aquele que pratica alguma das religiões que buscam resgatar práticas pagãs.
Pré cristão é tudo aquilo que veio antes de Cristo, incluindo-se nesse “tudo” cultos.
A Wicca possui elementos pré cristãos? Sim, possui. E não só a Wicca. Diversas religiões possuem. O que acontece é que esses elementos são, muitas vezes, adaptados, remodelados, incorporados a outros, ganham novos significados, novas interpretações. É um processo que ocorre em todo tipo de crença. A religião é moldada conforme os ditames dos seres humanos, seus hábitos, seus medos, seus desejos. Isso não diminui uma crença. Creio que a ânsia humana por uma verdade absoluta seja tão forte, que tendemos a achar que encontraremos essa verdade em algo que veio antes de nós, algo que somente os antigos sábios tinham acesso, algo que se perdeu e que precisa ser resgatado.
Bem... o fato é que não existe uma verdade absoluta dita pelos seres humanos.
A Wicca nasceu sob esse prisma, com certeza.
Certa de que a Wicca é uma religião neopagã e não pré cristã é que digo: Apesar de celebrar também a morte, uma pessoa que pratica Wicca não sacrifica animais, por mais que possamos constatar que civilizações pré cristãs o faziam.
Diante dessas idéias é que volto a perguntar: O que teria a ver uma pessoa que se diz praticar Wicca buscar em São Cipriano algum ensinamento?
Parece que algumas pessoas gostam de viver à sombra do prosaico catolicismo, gostam de se imaginar no fogo da inquisição. Como alguns evangélicos que falam mal dos católicos, mas que crêem num diabo muito mais poderoso que o dos católicos, e que se não fosse esse diabo não conseguiriam encher os bolsos de dinheiro a custa do medo alheio.
Engraçado que, muitas vezes, as mesmas pessoas que compram um livro de Cipriano para fazer rituais em cemitério são aquelas que mandam e-mails indignados sobre reportagens que falam que Wicca, bruxaria, feitiçaria é coisa do capeta.
Que tal começarmos a defender aquilo que acreditamos de forma correta e clara? Estudando de tudo, até Cipriano, se for o caso, mas deixando cada coisa em sua gaveta.
Que tal nos posicionar como pessoas de fato felizes pelo fim da inquisição, cientes da conotação política que essa ação teve no passado?
Que tal nos voltar aos ensinamentos reais de uma religião que cultua a natureza e tudo que ela contém? As trevas, a escuridão, a obscuridade, a destruição, o oculto... Mas também, a luz, o dia, o sol, as cores, os nascimentos?
Que tal aprendermos o que é viver o ciclo vida-morte-renascimento com mais prazer, mais liberdade, mais conhecimento, mais responsabilidade, agindo em prol da Mãe Terra, sem jogar papel ou pontas de cigarro na rua?
Espero que possamos entender que é possível beber água de muitas fontes,e que, embora em todas as fontes encontremos água, o caminho para chegar a cada fonte é diferente, e a água pode adquirir características diferentes de uma fonte para outra.
Bênçãos!
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RESPOSTA DE UM BRUXO TRADICIONAL IBERICO
O que pode ter ocorrido também é um engano da própria dona da loja de artigos religiosos, confundindo possíveis praticantes de Bruxaria com Wiccanos (afinal, nem todos os Bruxos são da Wicca).
E a Feitiçaria de São Cipriano envolve todo um universo cultural mágico-religioso de raiz ibérica medieval, com contributos de feiticeiras e feiticeiros africanos, que ao chegar em Portugal (as tradições mágico-religiosas africanas chegaram em solo europeu muuuito antes de aportarem no Brasil...) acabaram por se mesclar às tradições das Bruxas (os) e Feiticeiras (os) portugueses... e este legado acabou sendo condensado em livros, em grimoires, tais como as várias edições creditadas a São Cipriano, assim como o Livro da Bruxa de Évora, o Livro do Touro Negro, o Livro do Feiticeiro, etc.
São obras que versam sobre Bruxaria Tradicional, em uma de suas tantas vertentes. Não se trata necessariamente de feitiçaria pagã pré-cristã, e muito menos wiccana (e como vc mesma bem lembrou, Wicca é moderna, apesar se possuir elementos de origem pré-cristã).
Realmente, a Feitiçaria de São Cipriano não combina com a magia típica da Wicca, por se tratar de extratos culturais diferentes! Distantes, no tempo e no espaço. Mas, isso tudo só demonstra o quão diversificada e plural é a Bruxaria, antropologicamente falando: Bruxas e Bruxos são livres para praticar os rituais que bem entenderem.
Quanto aos Wiccans, em específico, para se manterem coerentes com a proposta original de Gerald Gardner (criador da Wicca), aí sim devem se adequar àquilo que o Book of Shadows prescreve...
Entretanto, com as propostas ecléticas surgidas nas décadas posteriores, passam a existir inúmeras interpretações, leituras e releituras da Wicca... e assim, hoje em dia ser Wiccan muitas vezes é encarado como algo pessoal, cuja interpretação vai partir da experiência e da percepção do indivíduo... nessas, encontramos as mais diversas variações: Wicca Grega, Wicca Xamânica (com influências culturais de origem nativa norte-americana)... e até mesmo Wicca Cristã e Wicca Satânica!
Concordo ou discordo disso? Nem um e nem outro: não sou Wiccan, sou Bruxo Tradicional Hereditário. Mas o que concluo é que muito bem vinda é a liberdade de crer, ler e interpretar.
Quanto às deturpações que podem advir do abuso de tal liberdade, aí vai de cada qual... concordo que misturar aleatória e inconsequentemente informações culturais de origens diferentes, apenas por mero capricho não pensado, não estudado e não meditado, pode sim ocasionar acidentes de cunho espiritual e energético.
Mas, ainda assim, não é a Arte Bruxa (pouco importando se encarada pela ótica tradicional ou moderna) o Caminho do Vôo sobre o Abismo? E não é a Bruxa (o) aquela/aquele que conseguiu transpor o Abismo, chegando ao Sabá na Colina Oca? Circundado por um Coven ou não, o Caminho Iniciático do Bruxo (a) é pessoal, particular, único, idiossincrático e intransferível... ninguém pode gozar as delícias pelo Peregrino (a)... nem sofrer as consequências de seus passos mau calculados... tais conquistas são do peregrino... e de mais ninguém...
No que toca a São Cipriano, estou produzindo uma palestra sobre a tradição, mito, história e simbolismos envolvendo tal personagem em relação à Bruxaria. O que posso adiantar é: a versão da Igreja Católica sobre a história de tal personagem é UMA leitura. Há outras... inclusive dentre as próprias linhagens de Bruxos Tradicionais... portanto: São Cipriano pode não estar diretamente ligado à Wicca em particular... mas histórica, folclórica e iniciaticamente está sim ligado à Bruxaria de Tradição, em mais de uma de suas vertentes.
FONTE; Raven Luques McMorrigú
www.iberiaeterna.blogspot.com
Lua Serena disse... Oi, Raven! :)
Muito bom o seu texto.
Com certeza Cipriano não tem absolutamente nada a ver com a Wicca, no meu entender. Já com a Bruxaria Tradicional, não posso afirmar já que o próprio termo Bruxaria Tradicional é tão controvertido...
O que espero é que possamos ver sua palestra sobre o tema, em breve. FONTE; www.caldeiraodecirce.blogspot.com.br
RESPOSTA DE UM BRUXO TRADICIONAL IBERICO
O que pode ter ocorrido também é um engano da própria dona da loja de artigos religiosos, confundindo possíveis praticantes de Bruxaria com Wiccanos (afinal, nem todos os Bruxos são da Wicca).
E a Feitiçaria de São Cipriano envolve todo um universo cultural mágico-religioso de raiz ibérica medieval, com contributos de feiticeiras e feiticeiros africanos, que ao chegar em Portugal (as tradições mágico-religiosas africanas chegaram em solo europeu muuuito antes de aportarem no Brasil...) acabaram por se mesclar às tradições das Bruxas (os) e Feiticeiras (os) portugueses... e este legado acabou sendo condensado em livros, em grimoires, tais como as várias edições creditadas a São Cipriano, assim como o Livro da Bruxa de Évora, o Livro do Touro Negro, o Livro do Feiticeiro, etc.
São obras que versam sobre Bruxaria Tradicional, em uma de suas tantas vertentes. Não se trata necessariamente de feitiçaria pagã pré-cristã, e muito menos wiccana (e como vc mesma bem lembrou, Wicca é moderna, apesar se possuir elementos de origem pré-cristã).
Realmente, a Feitiçaria de São Cipriano não combina com a magia típica da Wicca, por se tratar de extratos culturais diferentes! Distantes, no tempo e no espaço. Mas, isso tudo só demonstra o quão diversificada e plural é a Bruxaria, antropologicamente falando: Bruxas e Bruxos são livres para praticar os rituais que bem entenderem.
Quanto aos Wiccans, em específico, para se manterem coerentes com a proposta original de Gerald Gardner (criador da Wicca), aí sim devem se adequar àquilo que o Book of Shadows prescreve...
Entretanto, com as propostas ecléticas surgidas nas décadas posteriores, passam a existir inúmeras interpretações, leituras e releituras da Wicca... e assim, hoje em dia ser Wiccan muitas vezes é encarado como algo pessoal, cuja interpretação vai partir da experiência e da percepção do indivíduo... nessas, encontramos as mais diversas variações: Wicca Grega, Wicca Xamânica (com influências culturais de origem nativa norte-americana)... e até mesmo Wicca Cristã e Wicca Satânica!
Concordo ou discordo disso? Nem um e nem outro: não sou Wiccan, sou Bruxo Tradicional Hereditário. Mas o que concluo é que muito bem vinda é a liberdade de crer, ler e interpretar.
Quanto às deturpações que podem advir do abuso de tal liberdade, aí vai de cada qual... concordo que misturar aleatória e inconsequentemente informações culturais de origens diferentes, apenas por mero capricho não pensado, não estudado e não meditado, pode sim ocasionar acidentes de cunho espiritual e energético.
Mas, ainda assim, não é a Arte Bruxa (pouco importando se encarada pela ótica tradicional ou moderna) o Caminho do Vôo sobre o Abismo? E não é a Bruxa (o) aquela/aquele que conseguiu transpor o Abismo, chegando ao Sabá na Colina Oca? Circundado por um Coven ou não, o Caminho Iniciático do Bruxo (a) é pessoal, particular, único, idiossincrático e intransferível... ninguém pode gozar as delícias pelo Peregrino (a)... nem sofrer as consequências de seus passos mau calculados... tais conquistas são do peregrino... e de mais ninguém...
No que toca a São Cipriano, estou produzindo uma palestra sobre a tradição, mito, história e simbolismos envolvendo tal personagem em relação à Bruxaria. O que posso adiantar é: a versão da Igreja Católica sobre a história de tal personagem é UMA leitura. Há outras... inclusive dentre as próprias linhagens de Bruxos Tradicionais... portanto: São Cipriano pode não estar diretamente ligado à Wicca em particular... mas histórica, folclórica e iniciaticamente está sim ligado à Bruxaria de Tradição, em mais de uma de suas vertentes.
FONTE; Raven Luques McMorrigú
www.iberiaeterna.blogspot.com
Muito bom o seu texto.
Com certeza Cipriano não tem absolutamente nada a ver com a Wicca, no meu entender. Já com a Bruxaria Tradicional, não posso afirmar já que o próprio termo Bruxaria Tradicional é tão controvertido...
O que espero é que possamos ver sua palestra sobre o tema, em breve.
Clavis Inferni, o Grimório de São Cipriano:
ResponderExcluirhttp://images.wellcome.ac.uk/indexplus/image/L0040813.html
Os livrinhos com simpatias, "feitiços" e maus tratos contra animais também eram mania na Escandinávia. O Grimório, por outro lado, segue as técnicas dos livros padrão de magia elitizada, como Abramelin e algumas versões da Chave de Salomão.
Esses livros tipo ¨Grimório¨ tem origem em velhos manuscritos medievais e do início da Era Cristã, escritos em latim e grego arcaico, eram reformulações customizadas de antigas receitas de feitiçarias caldaicas, babilonicas, egipcias, coisas muito antigas, mesopotamicas e depois devidamente costuradas com rituais pagãos grecoromanos com pitadas de cristianismo primitivo,cabala, todo aquele hermetismo renascentista,além de muita mitologia persa(anjos, Zoroastro,etc.)
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